17  Anexo 1 – Conectividade local baseada na análise de circuitos

17.1 Contexto geral

Durante a elaboração do projeto, foi considerada uma outra abordagem para avaliar a conectividade da paisagem. Uma opção alternativa ao filtro kernel testada foi a análise de conectividade baseada em teoria de circuitos (McRae, 2006), utilizando a implementação de Omniscape para Julia Hall et al. (2021). Em virtude de algumas limitações computacionais dessa análise e de alguns padrões encontrados nos resultados, além de alta correlação do resultado do Omniscape com o resultado obtido utilizando o filtro kernel, decidimos seguir com a análise original (a descrição consta na metodologia de conectividade local). Entretanto, como compartilhamento de informações, apresentamos aqui a metodologia da análise utilizada e o mapa final obtido para o Brasil.

17.2 Códigos e bases de dados

Código

A documentação da análise para a criação da camada de conectividade local baseada na análise Omniscape está disponível nos endereços abaixo. O código para a reprodução da análise pode ser encontrado no seguinte endereço: https://github.com/Resiliencia-climatica-Brasil/connectivity-omniscape/blob/main/implementacao-omniscape.qmd.

Devido ao alto custo computacional a análise foi rodada em partes menores (tiles), que foram posteriormente combinadas. O código para a fragmentação da análise em tiles, e posterior combinação dessas partes menores, está disponível neste endereço: https://github.com/Resiliencia-climatica-Brasil/connectivity-omniscape/blob/main/tiles-omniscape.

Bases de dados

A base de dados para gerar a análise é a camada de resistência para as classes de uso e cobertura do solo tendo como base o Mapbiomas Coleção 8. A descrição da análise para gerar essa camada está apresentada no item de Conectividade local (Capítulo 12).

17.3 Metodologia utilizada

A análise tem como base o raster de resistência utilizado na análise de conectividade local (descrito em Capítulo 12). Para a análise de circuitos, utilizamos um raio da área de interesse de 200 pixels (18 km), que é o raio de busca ou tamanho da janela móvel circular, e um bloco central de 19 pixels (~1,7 km). O tamanho do raio foi equivalente ao utilizado no cálculo dos valores de Z da camada de heterogeneidade da paisagem (200 pixels). O bloco central foi definido como 10% do tamanho do raio (Landau et al. 2021). Como o tamanho do bloco precisa ser ímpar, atribuímos um valor de 19 células.

Devido à alta demanda computacional, a superfície de resistência para todo o Brasil foi fragmentada em 9 tiles com sobreposição de 10 vezes o raio (raio de 200 e sobreposição de 2.000 pixels). Após o processamento individual dos tiles, foram removidos os 1.000 pixels de cada borda sobreposta, eliminando o efeito de borda devido à fragmentação em tiles. Feito isso, foi realizado o mosaico dos tiles, resultando na superfície de conectividade utilizando Omniscape para todo o Brasil. Essa fragmentação para o processamento de grandes regiões é importante para que as análises possam ser feitas com menor poder computacional, sem prejuízo aos resultados. O output do Omniscape são três arquivos de conectividade relacionados:

  • Corrente de fluxo (flow_current) é o fluxo que aconteceria sem levar em conta a camada de resistência. Ele leva em conta a configuração espacial da paisagem (estreitos e barras) e dos pixels de baixa resistência de origem. Nem todo pixel é pixel fonte, mas a corrente que entra em cada pixel de baixa resistência entra sem resistência. Corrente de fluxo é usado como um “modelo nulo” de conectividade;
  • Corrente acumulada (cummulative_current) é a corrente acumulada levando em conta a configuração espacial e os valores de resistência;
  • Corrente normalizada (normalized_current) equivale a cumulative_currentflow_current e controla o efeito da configuração espacial do cálculo de conectividade.

17.4 Resultados obtidos

O resultado da análise de circuitos pode ser visualizado na Figura 17.1. Através dessa análise, é possível verificar, pela corrente acumulada, os corredores que conectam fragmentos de vegetação nativa por locais com baixa resistência ao deslocamento.

Figura 17.1: Conectividade local calculada pela análise de corrente acumulada do Omniscape. Maiores valores de conectividade (em azul) mostram maior oportunidade de movimentação das espécies baseada nos valores de resistência atribuídos aos tipos de uso e cobertura do solo.

Pelo resultado obtido, percebe-se que há um acúmulo de corrente próximo às regiões de alta resistência. Esse efeito é observado nas bordas do raster e é mais acentuado em ilhas. Esse resultado é esperado pelo método e pelos valores de resistência atribuídos, mas há divergências sobre sua explicação biológica e aplicabilidade para o nosso estudo. Além disso, um acúmulo de fluxo importante também é visualizado no limite com o oceano, o qual representa uma barreira para o deslocamento dos organismos e faz com que a conectividade seja mais baixa nesses locais.

Uma limitação encontrada no nosso estudo foi com relação ao padrão observado no limite político continental do Brasil. Uma vez que o nosso mapeamento se concentrou dentro dos limites do Brasil, os países vizinhos não foram mapeados. Isso fez com que os limites do país (tanto o continental, quanto o oceânico) representassem uma barreira intransponível, com consequências para o fluxo de conectividade. Uma complementação importante para a nossa análise, seria a inclusão de uma faixa de borda no limite continental, contemplando diferentes usos e coberturas do solo dos países que fazem fronteira com o Brasil. Esse mapeamento é possível e está disponível pelas diferentes iniciativas do Mapbiomas, mas não houve tempo hábil para a implementação durante a execução do presente projeto. Para obtermos uma superfície de conectividade adequada para o Brasil, seria necessário o cálculo considerando o efeito de borda discutido acima de pelo menos 5 vezes o raio do Omniscape para dentro do continente, utilizando uma superfície de resistência dessa dimensão como um buffer.

Apesar das desvantagens mencionadas, esse método realça corredores de acúmulo de corrente, especialmente ao atravessar obstáculos mais resistentes ao movimento como é o caso dos cursos d’água, onde a corrente acaba se concentrando em áreas de menor largura dos rios. Diferente do método de kernel, que mede a resistência média na paisagem, o Omniscape modela os corredores disponíveis dada a estrutura espacial dos elementos da paisagem. Numericamente, a conectividade pelo Omniscape fica mais contrastante entre as diferentes resistências em comparação ao kernel. Esse efeito é relevante na detecção de corredores e é mais aparente em regiões mais fragmentadas, como é o caso da Mata Atlântica, em que a conectividade fica mais concentrada pelo método do Omniscape e dispersa pelo kernel. Avaliamos também o uso do kernel como entrada para o Omniscape. Entretanto, os resultados da análise com kernel diluíram muito corredores e passagens menores, por conta da natureza de suavização da superfície de resistência pelo kernel. Por esse motivo, essa abordagem foi descartada.

Uma grande limitação da análise Omniscape é a alta demanda de memória RAM, apesar dos esforços recentes para aumentar a sua eficiência computacional e paralelização dos processos. O raster de resistência do Brasil foi fragmentado em 9 partes (tiles) e a análise foi rodada em um computador com 1 Terabyte (1024 Gigabytes) de memória RAM e 54 threads, onde o processamento de cada tile durou de 20 a 24h, totalizando 8-9 dias.